À Noite

Era noite na cidade em que morava. O sol já se tinha retirado há muito e a lua não se encontrava visível da sua janela. Mas no ar pairava um odor que lhe despertava os sentidos. Olhando a rua e os transeuntes pensava nela e só nela. Imaginava-a tal como a havia visto da última vez. Aquele olhar, aqueles lábios que tantos sentimentos haviam despertado no seu último beijo, tudo nela era agora uma recordação, mais viva que ele próprio.
Fechando a janela, voltou ao quarto. Deitou-se na sua cama e ficou a olhar o branco do tecto. Naqueles momentos conseguia divagar sozinho por caminhos nunca dantes navegados, conseguia voar, conseguia ser livre tal como sonhava ser. Por mais que tentasse, não a tirava da cabeça. Só a via a ela e no entanto esses pensamentos de nada lhe valiam a não ser para agravar a saudade.
Foi então que ela apareceu. Tocando-lhe o peito despido e beijando-o, desejou-lhe uma boa noite e deitou-se junto dele. Deitou-se sem mais palavras, enroscando-se nos lençóis e encostando o seu corpo no dele. Ele, sentindo a excitação do momento, abraçou-a e sem dizer uma palavra que fosse, deitou a sua cabeça sobre o ombro dela e suspirou. Era uma surpresa que ela lá estivesse, nunca tinha pensado tal coisa. Parecia-lhe um sonho e no entanto ela estava lá. Deixou cair uma lágrima de felicidade e então algo o fez estremecer.
Acordou de repente, com o ruidoso toque de um telefone.
No local onde ela tinha estado, encontrava-se um vazio. Um vazio tão grande que o fez soluçar. Voltara a sonhar com ela. Voltara a pensar nela como sendo sua. Queria tê-la ali consigo.
Olhou o visor do objecto que o acordara e viu o nome no ecrã. Rejeitou a chamada e voltou a deitar-se. Não conseguia falar com ela naquele momento, queria apenas tê-la, sem que fosse preciso libertar uma única sílaba.

Se ao menos o romance não fosse tão difícil de viver...